Quando e como entrou no Setor de Design do CETEC?
Indicado por um arquiteto com quem havia trabalhado, Cid Horta, fui fazer uma entrevista com Marcelo Resende (cabeludo e de óculos redondo e azul). Bem recomendado ele me contratou. No dia 13 de janeiro de 1973 assinaram minha carteira. Numero: 004. O quarto funcionario a ser contratado pelo então recém criado CETEC. Cargo/função: designer (acho que sou o primeiro do Brasil que tem isso escrito na carteira profissional, pois até então todos nos eramos desenhistas industriais ou programadores visuais) Graças ao Marcelo o setor era de Design e nós erámos designers. Isso em 1973! Eu então com 20 anos nas costas. Melhor epoca da vida!
Quando e como saiu do Setor de Design do CETEC?
Sai aos pouquinhos. Primeiro fui fazer uma pós-graduação na Suíça (79), logo depois que voltei (81) fui convidado pelo CNPq para ajudar Gui Bonsiepe a estruturar um Programa de Design e assim acabei ficando por lá. Somente em 84 fui efetivado no CNPq e tive de romper meu vinculo com o CETEC. Em 83 chamei (pelo CNPq) Marcelo para Coordenar o Laboratório de Design de Campina Grande.
Qual foi sua atuação no Setor de Design do CETEC?
Designer. Mais gráfico que produto. Muito mais...Depois quando estava no CNPq tentava ajudar à distância com propostas e projetos (tecnologias apropriadas)
Qual, dentre os projetos realizados pelo Setor de Desenho industrial você gostaria de destacar? Fale um pouco sobre ele.
Setor de Design, corrija please. O que mais gostei de fazer foi o de sinalização urbana com Taquinho (Eustaquio Lembi de Faria, grande figura). O que eu acho mais poético, mais ingênuo, e mais bacana, foi o de Juramento, capitaneado por Cláudio Martins e Cadinho (Ricardo Mineiro) Isso dava um longo artigo.
Você atribui a abertura do setor a alguma pessoa ou situação?E o fechamento?
Na abertura sobrou visão de futuro (Luiz Carlos Monteiro) e no fechamento faltou essa mesma visão (esqueci quem era na época, coisas de minha memória seletiva).
Como era a relação entre os participantes do setor?
Grande família. Trabalho e festa, festa e trabalho, todos juntos, o tempo todo. Crescendo juntos! Aprendendo juntos.
Como era a relação do setor com o restante do CETEC?
Estranhos (mas queridos) no ninho (os cabeludos do dizarme, diziam...)
Se você tiver alguma foto da época, pode enviar que daremos o crédito.
Perdi tudo na enchente em Floripa. Mas na minha memória ficou uma foto que nunca existiu, munca foi tirada, até porque nela estariam pessoas que estiveram conosco no CETEC em épocas diferentes, mas nessa foto teriam de estar: Marcelo, Cadinho, Taquinho, Oswaldo,Chiari, Érico Dirceu, Claudio, Olinda, Regina, Roberto, Mariangela, Paulo Sérgio, Vania, Auxiliadora, Marcinho, Biagio, Ibere, Chicão, Guido, Patricia, Wagner Magrelo, Gazzinelli, Jorge e muitos outros.
E finalmente, o que você faz hoje?
O mesmo que fazia naquela época: DIZARME,DEZAINE,DIZAININ. Ou seja, naquela época como agora, ninguém entende direito o que fazemos.
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16 de março de 2009
11 de outubro de 2008
27 de abril de 2008
Entrevista publicada no Diario do Nordeste 27/Abril/2008

Na segunda metade da década de 90, o Instituto Dragão do Mar promoveu uma mudança profunda em diversas áreas: teatro, dança, audiovisual e um certo design. O projeto era ousado e ainda hoje seus frutos são lembrados, com muitos de seus egressos trabalhando como profissionais. Eduardo Barroso dirigiu o Centro de Design do Ceará, parte do Instituto, de 1997 a 2001. Atualmente é sócio-diretor da Empresa Ser Criativo e do Instituto D'Amanhã com sede em São Paulo. Na entrevista a seguir, ele fala daquele tempo e recupera memórias, além de lançar um olhar aguçado sobre o design praticado no Brasil hoje
Você participou da construção do programa do curso de design do Instituto do Dragão? O que foi levado em consideração na época? Quais áreas eram postas em evidência?
O Dragão do Mar, em sua concepção original, tinha como premissa questionar os modelos e as estruturas vigentes na formação de recursos humanos para a área da cultura. O Centro de Design do Ceará nada mais era do que um reflexo desta política, quase utópica, de produzir um saber e um fazer voltados para o futuro. Trouxemos para ajudar a pensar o Centro de Design do Ceará pessoas cuja trajetória na área do ensino tivesse sido pautada pela inquietação e permanente questionamento. Durante uma semana, no inicio da primavera de 1996, estivemos reunidos com Augusto Morello, da Itália; Luis Rodrigues, do México; Joaquim Redig, do Rio; Romeu Damaso, de Minas Gerais e Lia Mônica, da Paraíba. Este eclético time de professores de design, com formações diferenciadas tinha algo em comum: o desejo de desenhar a escola com a qual sempre sonhamos. Uma escola minimamente preocupada em distribuir diplomas. Preocupada apenas em formar pessoas para a vida. Uma escola em que não importassem os títulos acadêmicos dos professores, valendo principalmente sua experiência profissional e sua capacidade de transmitir lições de vida. Uma escola da qual seus ex-alunos se orgulhariam no futuro, lembrando que no primeiro dia de aula o tema tratado foi a ética, sobretudo em um momento de nossas vidas onde esta palavra perdeu tanto valor.
Você poderia fazer um comparativo entre a demanda de profissionais daquele período e de agora?
Naquele momento existia uma demanda reprimida e incipiente, de difícil dimensionamento. Nestes quase dez anos que se passaram o design entrou na moda. Passou a ser uma área de atuação ambicionada e indispensável para um país que busca sua inserção no mercado internacional, cada vez mais competitivo, onde o valor dos produtos é determinado pelo valor simbólico.
Qual era o quadro geral do design do Estado naquela época? Os profissionais estavam mais ligados a que área?
Me recordo perfeitamente de ter dito, em umas das primeiras reuniões com Paulo Linhares e Maurice Capovilla, que naquela época o Brasil já tinha quase cem cursos superiores de design. Mais cursos que os existentes em toda a Europa ocidental, e portanto não era necessário abrir mais nenhum. Necessitávamos sim de um curso diferenciado, voltado para o futuro e não para o passado. Projetamos e construímos uma escola onde os alunos tinham aulas com os melhores professores e designers do Brasil e mesmo do exterior, apesar de todas as dificuldades provocadas pelas barreiras lingüísticas. Foi inesquecível ver Augusto Morello dando aula em italiano, para surpresa de alguns e irritação de outros. Afinal era isto ou nada. Sabíamos que ele estava no fim de sua vida e a sua simples presença, com sua sabedoria e experiência eram como um farol na escuridão. Afinal quantos de nós tivemos a oportunidade de conviver, mesmo que por breves instantes, com os grandes homens de nosso tempo? Assim como ele, trouxemos renomados professores da Alemanha, Holanda, França, Suíça, Bélgica, Espanha, México, Estados Unidos, Argentina, Chile...Hoje, olhando para trás estou seguro que poucas escolas de design no Brasil tiveram um time de professores como o CDC.
Apesar de ter sido tão importante, o CDC acabou sem ter a tão sonhada continuidade...
Apenas para se ter uma idéia da importância que tinha o Centro de Design do Ceará, uma pesquisadora da Universidade da Flórida escreveu um artigo onde o CDC foi citado como um dos dois experimentos mais inovadores de ensino do design na América Latina. No entanto, este centro foi fechado com a alegação de que custava muito caro e que não dava diplomas. Gosto de lembrar que implantamos um sistema, onde as pessoas com talento mas sem recursos financeiros recebiam do estado uma bolsa de estudo e aqueles que podiam pagavam suas mensalidades como em uma escola particular. Um modelo parecido com o que existe nas universidades americanas.
Indo além das especializações, como os profissionais podem ser comprometidos com a cidade em que vivem? Comprometidos politicamente, inclusive?
O design é sinônimo de inovação. É improvável pensar que podemos introduzir a cultura da inovação sem provocar rupturas e desavenças sobretudo em uma sociedade onde uma parcela importante de sua população ainda não conseguiu se desfazer de práticas obsoletas e anacrônicas no campo dos avanços sociais, da educação, da cultura ou das práticas produtivas. Projetar é e será sempre um ato político. Toda vez que projetamos um produto estamos fazendo uma afirmação do tipo de sociedade que desejamos. Lá no CDC ensinávamos a pessoas a serem antes de tudo cidadãos conscientes de seu papel na sociedade.
Ainda pensando na questão anterior, como o designer pode contribuir na consolidação da identidade cultural de uma cidade? Tendo em vista o artesanato, o trabalho que identifica uma comunidade...
Olhando para dentro de si mesmo. Buscando em seu passado, em sua história e suas lembranças afetivas aquilo que nos torna únicos e singulares. Um designer é acima de tudo um decodificador de repertórios culturais. Nosso maior patrimônio é nossa cultura. É isso que irá nos diferenciar em um mundo cada vez mais globalizado e ávido por produtos que tenham uma história para contar.
O que se pode dizer quando os produtos do designer ocupam as salas de um museu? O que esse deslocamento provoca?
Um museu, em uma concepção mais contemporânea, não é apenas o depositário de uma memória cultural. É acima de tudo um espaço de reflexão para se pensar a sociedade em seus múltiplos momentos históricos e sociais. Um produto de um designer quando chega ao museu significa que teve um papel importante na construção de uma cultura material de determinado momento, sendo causa e reflexo de mudanças.
13 de abril de 2008
Entrevista publicada no Jornal Cafe com Letras de Belo Horizonte

Você tem sido considerado uma das pessoas que mais entendem de gestão em artesanato e design no Brasil. Como se deu a passagem entre um profissional formado em Design Industrial pela FUMA (atual UEMG) para um consultor em gestão de design e artesanato internacional?
Depois que voltei de meu mestrado na Suíça, em 81, fui trabalhar no CNPq, em Brasília, colaborando na montagem de um Programa Nacional de Design. Percebendo um espaço mais amplo de atuação diversifiquei e ampliei minhas atribuições e responsabilidades, propondo, implementando e coordenado um pioneiro Programa de Tecnologias Apropriadas ao Meio Rural. Esta experiência me aproximou do “fazer e do saber popular” assim como da percepção da importância da cultura autóctone como matriz diferenciadora de produtos e serviços, em um mercado cada vez mais ávido por bens simbólicos.
Esta experiência durou cinco anos, findo os quais fui para Florianópolis reestruturar o Laboratório Brasileiro de Design, onde permaneci no cargo de diretor durante os 10 anos seguintes. Tendo de assumir funções administrativas para as quais não havia sido preparado, atuei nos primeiros anos baseando minhas decisões pelo bom senso e pela intuição. Buscando um maior embasamento para este novo desafio, de gestor de um centro de pesquisas e de inovação, me matriculei no programa de doutorado do departamento de Engenharia de Produção e Sistemas da UFSC, onde o conjunto de disciplinas oferecidas, me trouxe as informações e insumos conceituais que necessitava, em especial aquelas relacionadas com o planejamento estratégico e a gestão do conhecimento.
A experiência adquirida com um projeto que desenvolvemos no LBDI de promoção do artesanato Catarinense, ampliou minha visibilidade além das fronteiras do Brasil, abrindo as portas para intervenções assemelhadas na Colômbia e no México. A partir deste ponto as demandas se multiplicaram, em especial, graças à criação, pelo SEBRAE, de seu Programa de Artesanato em 1999, do qual sou colaborador, intervindo em 17 estados da federação.
Qual a importância do papel político do designer para os países em desenvolvimento? Quais são as principais formas de atuação profissional para que o designer possa se tornar ativo nos processos de desenvolvimento social?
Stephano Marzano, diretor de design da Philips, já dizia que “projetar é um ato político, pois toda vez que projetamos um produto estamos fazendo uma afirmação do tipo de sociedade que aspiramos e de futuro que queremos”. Isto nos obriga a termos uma postura coerente frente aos nossos clientes (que produzem e comercializam o fruto de nossa inteligência) com os seus respectivos clientes, que irão consumir aquilo que projetamos. Temos a obrigação de alertar a todos sobre a importância de considerar os novos imperativos: respeito ao meio ambiente, respeito à cultura e responsabilidade social. Acredito que dentro de pouco tempo, estes atributos deixarão de ser uma vantagem competitiva para serem uma nova norma e obrigação das empresas. São estes atributos, e não mais o preço baixo, que farão diferença na hora de nossas escolhas sobre um produto ou um serviço.
Outra perspectiva de atuação do designer nos processos de desenvolvimento é através das instituições publicas, ocupando posições estratégicas, em especial nos conselhos. Seja em uma função consultiva, seja com atribuições normativas, os conselhos ainda são uma referência e naturais formadores de opinião.
Até que ponto as escolas de design no Brasil vêm formando profissionais habilitados para lidar com Design Social e outros processos de gestão em artesanato e design?
O ensino superior brasileiro esta dissociado da realidade do mercado, e as escolas de design não são uma exceção á regra. Ainda somos reféns de uma colonização cultural, que parece se perpetuar, e de uma idolatria a tudo que vem de fora, como se melhor fossem que os similares nacionais. Poucos são os docentes que passaram pela experiência de atuar no mercado de trabalho, realidade que conhecem apenas na teoria. Afinal como compatibilizar dedicação exclusiva na academia, que pouco exercita a pesquisa e não pratica a extensão, com a prática profissional? As universidades brasileiras, para poderem capacitar os futuros profissionais para a realidade de nosso mercado, terão de deixar de sonhar com as grandes empresas e passar a encarar as demandas das pequenas e micro empresas, a maioria delas com um sistema de produção de base artesanal.
Não há uma nítida impressão de que as escolas de design brasileiras têm focado apenas no design industrial, negligenciando uma formação mais política e responsável do seu aluno?
As escolas de design ainda insistem em oferecer um modelo de ensino calcado em uma divisão anacrônica do design, que estabelece sub-disciplinas que nada mais são que especializações. Assim temos cursos de design Industrial, design gráfico, webdesign, design de interiores, etc. Considero que o correto é oferecer uma formação integral, formando um “designer” capaz de atuar em qualquer domínio, e em qualquer contexto, consciente que estas especificidades são conseqüências apenas do emprego de processos tecnológicos de produção diferenciadores. Os processos mentais e criativos são os mesmos em todas estas especialidades.
O design social apenas incorpora uma dimensão nova, aquela que se preocupa com as conseqüências do produto sobre o meio ambiente e sobre a sociedade.
Dois exemplos de escolas que seguiram esta orientação: O Centro de Design do Ceará, que existiu de 1997 a 2002 e o curso de design da UNISUL, em Florianópolis.
Estas iniciativas tiveram seu projeto pedagógico elaborado por mim mas infelizmente descontinuados, ou alterados em sua concepção original, por razões econômicas. Uma escola ideal, com um ensino de qualidade, necessita de um corpo docente de alto nível e motivado, de investimento em pesquisa, de oficinas equipadas e isso tudo não custa barato.
Há um novo nicho de mercado para a atuação do designer que deseja trabalhar com responsabilidade social?
Em principio, qualquer produto deveria trazer embutida a preocupação com o bem estar coletivo e o respeito às gerações futuras. Projetar, produzir e consumir hoje o que não poderá faltar amanhã. São estes os novos imperativos. Cabem a nós, designers, arquitetos e engenheiros, que projetamos nossa cultura material, incluirmos em nossos projetos esta nova dimensão, antecipando-nos às demandas da sociedade e às exigências de nossos clientes, pois o mundo já não pode esperar por uma tomada de consciência coletiva. Deste modo todo projeto, não importa seu tamanho ou complexidade é uma oportunidade de exercitarmos nossa responsabilidade e dever social.
Pensando em termos de sustentabilidade dos projetos de capacitação coordenados por designers, quais os principais entraves os profissionais costumam enfrentar?
Sem estabelecer uma ordem de importância acho que um dos maiores entraves é a falta de informações confiáveis sobre insumos e processos, fazendo com que certas escolhas acabem encarecendo, e paradoxalmente tornando mais elitista os produtos “responsáveis”. Outro problema de difícil solução é a visão de curto prazo dos especialistas em mercado, que como os políticos, somente conseguem enxergar aquilo que puder ser colhido dentro do tempo de seu mandato. Estes especialistas exercem forte influência nas decisões das empresas, e apoiados pelas agencia de propaganda, conseguem migrar verbas que poderiam ser aplicadas em inovação para ações de promoção e publicidade, acreditando que isto é suficiente para sustentar uma empresa no mercado. Sustentabilidade é antes de mais nada visão de longo prazo. Projetar hoje o que vamos precisar amanhã.
O conceito de Economia Solidária vem sendo muito discutido quando se trata de projetos que envolvam a produção artesanal. Como você entende uma possível relação entre artesanato e design social?
Entendo como um continuum, um processo de trocas mútuas, onde o artesanato e o design necessitam um do outro para se renovarem. O design se nutre dos repertórios autênticos, dos elementos presentes na arte popular e no artesanato. O artesão por sua vez necessita da capacidade de decodificação criativa e do conhecimento de mercado que o designer possui para criar novos produtos. Apenas não devemos confundir artesanato com arte popular. Enquanto os artesãos necessitam e aspiram por uma colaboração que os auxilie a renovar seu “portfólio” de produtos, porém mantendo suas características singulares, os artistas populares devem ser preservados de quaisquer ingerências externas em seu modo de trabalho. Economia solidária não se avalia somente pelo viés econômico mas também pela solidariedade entre o saber e fazer e o circulo virtuoso que isso acarreta.
Seria possível citar alguns exemplos de projetos de capacitação em artesanato e design bem sucedidos? Quais ações e grupos de designers vêm se destacando nacional e internacionalmente nesta área?
Considero o trabalho do Renato Imbroisi, da Ângela Carvalho, do Laboratório Piracema (Nemer e Heloisa Crocco) e principalmente de Janete Costa, como esforços bem sucedidos de intervenção no setor artesanal. Já os trabalhos de alguns especialistas estrangeiros que atuaram na região centro-oeste do Brasil, me parecem intervenções pretensiosas e perigosas, elegendo falsos ícones, propondo produtos com uma estética urbana simplista e desenraizada. Em se tratando de unidades de produção artesanal, dezenas vêem se destacando. Gosto de citar algumas, por apreço e consideração ao seu esforço. São elas: Viver de Arte, em Alagoas; Cores da Terra na Bahia; Oficina de Agosto em Minas Gerais...
E o papel do SEBRAE neste cenário nacional? Até que ponto a pretensão desta instituição governamental seria apenas de formalizar os grupos de economia informal? Quais as políticas de empoderamento real das comunidades assistidas o SEBRAE vem adotando atualmente? Há uma preocupação com a sustentabilidade após a atuação de programas como o PSA?
Nenhum país do mundo ocidental investiu tantos recursos financeiros no setor artesanal como fez o SEBRAE nos últimos dez anos. Isto contribuiu para um salto qualitativo na produção artesanal. Entretanto muito ainda deve ser feito pois como se trata de mudanças comportamentais, portanto de natureza cultural, isso leva tempo para ser processado e apreendido pelos artesãos. Outro problema diz respeito às estratégias adotadas nestas comunidades, que algumas vezes não consideram as especificidades do meio, em especial as relações de poder existentes e o comprometimento das lideranças reais, que, quando impermeáveis às mudanças propostas, podem colocar tudo a perder. As intervenções não podem ser pontuais e restritas a melhoria de processos e produtos. É necessária uma atuação em toda a cadeia produtiva e um acompanhamento e monitoramento dos resultados para possíveis correções de rota.
Culturalmente no Brasil o produto artesanal ainda é muito confundido com Arte Popular. Atualmente, quais são os desdobramentos que podem ser feitos para pensar o artesanato brasileiro? Quais as tipologias possíveis e quais delas possuem um maior potencial para receber a intervenção do designer através de programas de capacitação em artesanato e design?
Dentro do grande arcabouço conceitual e teórico que trabalhamos, existe uma clara definição dos distintos produtos “feitos à mão” que vão desde as peças de arte popular até aquilo que qualificamos como “industrianato” neologismo criado para abrigar um sem numero de produtos feitos em fábricas tradicionais que reserva ainda parte importante de sua produção ao trabalho manual, como é o caso dos produtos de estanho fabricados na região de São João del Rey para citar um exemplo. Nesta divisão que estabelecemos dois parâmetros são utilizados: o valor cultural e o volume de produção. Quanto maior for o valor cultural e menor a escala de produção menor deve ser a intervenção. O melhor nicho de produção para a atuação do designer são os produtos de referencia cultural, que são aqueles que preservam os elementos de identificação e de origem, expressos em suas formas, cores, símbolos e principalmente em suas técnicas de produção. Estes produtos merecem ser redesenhados e contextualizados com as expectativas e demandas do mercado.
Além da revista ARC DESIGN, quais as outras publicações têm valorizado o produto artesanal? Além de você, quais outros pensadores, teóricos ou críticos, vêm debatendo a importância do Design Social?
“Casa e Jardim” foi uma das revistas de decoração, de grande circulação, que sempre dedicou um bom espaço ao artesanato, inclusive edições inteiras especialmente dedicadas ao tema. As demais revistas de decoração também sempre privilegiam os bons produtos. Quanto aos que se dedicam em apoiar e promover o artesanato de modo constante e coerente não se pode dizer que são muitos. Este grupo que há cerca de 10 anos era quase inexpressivo, com o tempo vem crescendo. Devemos muito ao trabalho pioneiro de Janete Costa; ao esforço de divulgação de Adélia Borges; ao trabalho do pessoal de A Casa; aos coordenadores estaduais do PAB e do Sebrae, entre dezenas de outros.
E o mercado? Como ele tem oferecido oportunidades ao artesanato? Quais lojas, cooperativas ou projetos colaborativos e coletivos poderiam ser citados como referência na valorização do Design Social e do Artesanato?
O mercado local é o melhor meio para dimensionar o sucesso ou o fracasso de um produto. Um produto deve encantar primeiramente as pessoas de seu próprio entorno. A pretensão de ser universal deve começar em sua própria rua ou aldeia, como já dizia Tolstoi. Quanto as empresas que apóiam o artesanato cito em primeiro lugar a Tok-Stok e o Projeto Terra, assim como as Centrais de Artesanato e Artesol, além das rodadas de negócios organizadas pelo SEBRAE.
Fale um pouco de cada uma das suas recentes ações.
Minha primeira mudança foi a natureza de minha própria empresa “Barroso Design” excessivamente personalizada, para “Ser Criativo Empreendimentos Culturais do Brasil”, mais extensa em todos os sentidos, abrigando projetos de pesquisa na área cultural, eventos, publicações, e principalmente assessoria e planejamento estratégico para empresas de base cultural, apoiado por “parceiros estratégicos”. Sediada em Floripa a empresa atua dentro e fora do Brasil.
Meu segundo projeto é o Instituto D´Amanhã, em São Paulo. Projeto em parceria com Lílian Bomeny e World Trade Center. Nossa proposta é implantar um espaço de cooperação e intercâmbio, nacional e internacional, para o desenvolvimento de projetos de relevância cultural, principalmente relacionados com a capacitação de indivíduos a fim de que não serem mais qualificados como “mão-de-obra” mas sim como empreendedores capazes de projetar, produzir e vender produtos de alto valor simbólico. Estamos estruturando no momento um “Curso de Capacitação para agentes de promoção do artesanato” com 200 horas de duração, em cinco módulos de 40 horas. Este curso será oferecido em todo o país. No espaço térreo da casa funcionará a Galeria Objeto Singular espaço comercial e cultural com exposições temáticas, com os melhores produtos, não importa se artesanal, de design ou de arte popular, de uma determinada região.
O TOP 100 foi um projeto que desenvolvi e implementado pelo SEBRAE, com o intuito de identificar as cem melhores unidades de produção artesanal do país, mensuradas através de dez critérios, onde a qualidade do produto é apenas um critério. Para ser competitivo é necessário um conjunto de boas práticas, tanto produtivas quanto comerciais. Este projeto seria uma espécie de “benchmarking” do segmento artesanal tentando identificar e difundir as melhores práticas. Espero que este projeto não fique somente na primeira edição em 2006. A proposta inicial previa sua realização a cada dois anos. Vamos esperar.
E por ultimo, acabo também de concluir um livro sobre Parintins. Depois de presidir o júri do Festival Folclórico por dois anos consecutivos percebi que o Brasil e o mundo necessitam conhecer melhor esta festa única. Assim elaborei um livro de arte, com centenas de fotos, que aborda não somente o Festival (um espetáculo alucinante) mas também a história da cidade e seus bois de pano; a cultura material e iconográfica regional; a construção do espetáculo e o “making-off” nos galpões.
Todos estes projetos partem de uma mesma ambição ou de um sonho como preferem alguns: O de experimentar maneiras diferenciadas de praticar o design, dentro de um outro paradigma, onde a cultura, o meio ambiente e as necessidades da sociedade possam ser prioritariamente contempladas.
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