30 de outubro de 2009

Vender somente aquilo que se pode entregar

Os produtores de bens simbólicos de alto valor agregado, principalmente de artesanato, vivem hoje um dilema: ou mudam ou desaparecem. Para sobreviver dignamente em um mercado cada vez mais seletivo o primeiro passo é sair da informalidade. Porém isso significa ter obrigações sociais, pagar impostos, mas também acesso ao mercado. Desejo e fim de todos que produzem algo de valor.
O mercado nacional, até pouco tempo restrito e fechado vivendo em uma redoma artificial impostas por políticas protecionistas, abriu suas fronteiras. Descobriu outras culturas e começou a enxergar o valor da sua própria. As comemorações dos 500 anos do descobrimento serviram para os brasileiros resgatarem sua auto-estima e divulgar a marca Brasil mundo afora. Esta visibilidade crescente tende a aumentar exponencialmente nos próximos cinco anos por conta da Copa do mundo e das Olimpíadas. Os produtos “Made in Brazil” passarão a serem ainda mais desejados.
Ao mesmo tempo o mercado de consumo mundial vive um momento novo, comportando todo tipo de produtos, cujo fenômeno foi explicado brilhantemente por Chris Anderson em seu livro “A Cauda Longa”. Diante do crescimento exponencial da oferta começa a haver uma polarização nos mercados mais seletivos. De um lado os produtos e marcas globais, conhecidas, consagradas, cosmopolitas e confiáveis. De outro lado os produtos singulares, diferenciados, surpreendentes, vinculados a sua região de origem, com uma história para contar.
O consumo mundial esta pendendo entre produtos globais x produtos culturais. Nestes dois extremos ainda existe muito espaço de crescimento e quem tiver bons produtos seguramente encontrará muita demanda, que se devidamente prospectada poderá ser contadas aos milhares, ou milhões, de unidades por encomenda.
Aquilo que entanto parece ser a solução de todos os problemas, que é ter propostas de compra diante de si, na verdade é apenas uma ponta de todo o ciclo produtivo. Vender é a meta final de quem produz. Porém é preciso vender aquilo que se tem para oferecer.
Como na música de Jorge Drexler cada um só pode dar aquilo que tem ou recebe. Nada é mais simples. Não existe outra norma.
Neste novo cenário global podemos falar da importância das “fábricas de artesanato” por mais paradoxal que isso possa aparecer. Unidades produtivas que utilizam alta intensidade de mão-de-obra, qualificada e diferenciada. Com crescente capacidade produtiva na medida em que investem na formação de novos colaboradores e na substituição de tecnologias obsoletas, porém sem perder as características singulares que o diferenciam seus produtos da concorrência. São unidades capazes não somente de produzir bens culturais mas também são capazes de fazê-los chegar inteiros ao seu destino.
O conhecido “ciclo da inovação e do design” descrito no termo de referência sobre o artesanato brasileiro, aponta oito passos necessários para se chegar ao mercado. Este ciclo deve ser completo, sem pular etapas, para não repetir erros passados e cair em velhas armadilhas. São ações que resultam em um ciclo virtuoso que se vale de competências diferenciadas em todos os níveis.
Estes oito passos (pressupunha-se depois de quase dez anos de investimentos no setor) já deveriam ter sido seguidos por centenas de unidades artesanais do Brasil cujo reconhecimento tem sido concedido bianualmente na forma de um premio as cem melhores.
Porém um olhar detalhado sobre os vencedores permite identificar ainda carências não satisfeitas e problemas não resolvidos. Problemas que vão desde a falta de capital de giro para adquirir matéria-prima diante de grandes encomendas até a ausência de embalagens capazes de diminuir os 20% de perdas existentes no transporte.
A promoção e o esforço de venda, indispensável e desejável, deve ser acompanhado de uma abordagem sistêmica em todos os níveis da cadeia de produção, para não se transformar em um tiro no pé. Os contratos de compra cujos prazos de entrega não são cumpridos ou a entrega de produtos que não correspondem em qualidade aquilo que foi encomendado são as causas de fechamento de promissoras cooperativas e empresas artesanais antes existentes.
O artesanato brasileiro infelizmente, e salvo algumas exemplares exceções, ainda busca a maturidade necessária para aspirar sua inserção definitiva no mercado internacional. Devemos ter a capacidade critica de perceber nossas deficiências, sendo a primeira delas a falta de dados atuais e confiáveis, que confrontados se transformam em informação, e este quando assimilado vira conhecimento que aplicado na solução de problemas se transforme em inteligência competitiva.
Não podemos também nos esquecer da necessidade de uma renovação anual de nosso “portfolio” que valorize os referentes culturais, criando ofertas seletivas regionais; a indispensável capacitação técnica e gerencial dos produtores; uma logística adequada que possa escoar a produção sem perdas com o uso de embalagens apropriadas; acordos comerciais “justos” e finalmente enlaces sinérgicos com outros segmentos principalmente o de turismo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigado por deixar seus comentários.